(edição abr/2012)
A inocência em troca de um vídeo game
Por: Jogador X, para Revista ESPN
Com a desculpa de conseguir uma ascensão social através
do futebol, inúmeros crimes são praticados nos bastidores. Quase não se fala
dos assédios sexuais existentes nas divisões de base dos clubes brasileiros. Os
pais das vítimas muitas vezes sabem das ocorrências e “vendem” seus próprios
filhos em troca da titularidade, de um par de chuteiras ou de outras regalias
que ao justificam de forma alguma esse tipo de comportamento. Uma realidade
cada vez mais presente no dia a dia das escolinhas e categoria de base,
inclusive de times considerados grandes.
Em 1995, participei de um torneio no exterior para
atletas de até 12 anos, ocasião para jogar, se divertir e fazer coisas
inerentes à idade, já que era muito cedo para pensar no futuro como jogador de
futebol profissional. Os pais com um pouco mais de condições acompanhavam os
filhos, enquanto os demais ficavam apenas sob supervisão da comissão técnica.
A delegação dormia dentro de um ginásio de basquete,
com beliches espalhados por toda a quadra. Durante uma madrugada, acordei para
ir ao banheiro. Quando cheguei lá, vi o treinador fazendo sexo oral em um
menino de apenas 11 anos. Na verdade, não entendi direito o que estava
acontecendo. Voltei a dormir e, com a inocência de uma criança, contei aos meus
pais o que tinha visto.
Aterrorizados, eles foram falar diretamente com o
treinador, que justificou dizendo que estava ajudando o garoto a resolver um problema
de incontinência urinária. Indignados, meus pais foram aos pais da vítima, que
prometeram tomas providências. No dia seguinte, estava tudo normal. O treinador
comprou um videogame para o menino e tudo seguiu como se nada tivesse
acontecido.
Este foi mais um exemplo da doentia ligação entre pais
ignorantes e coniventes com pessoas inescrupulosas. Somos vítimas de uma
propaganda incorreta que mostra o futebol como uma máquina de fazer dinheiro e
como um trampolim para a fama. Nos esquecemos de que apenas uma parcela
insignificante chega a ingressas nesse grupo de “afortunados da bola”. Esquecemos
que mais vale um filho que se torna um cidadão de bem, que honra seus
compromissos, do que virar um jogador famoso nascido de um ato criminoso, um
abuso sexual.
Tenho esperança de que isso mudará. É urgente que se
faça uma dedetização desses aproveitadores que acabam com a moral e com a vida
dos atletas jovens com um lindo futuro à frente. Formemos cidadãos jogadores, sem
deixá-los à toa, sem pensar somente no retorno financeiro. E se fossem nossos
filhos ?
Autor: Jogador X é uma estrela do futebol brasileiro, com passagem por clubes do País e do
exterior, que conta, de forma anônima e sem filtros, histórias sobre a verdadeira vida de
um atleta profissional.
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